segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Aos sempre ausentes.

Resonam na mente palavras de ordem contra a ganância dos negociantes, frente aos podres poderes intransigente. Solto um berro sem nexo que ecoa o seu eco em algum fundo do inconsciente ... decadentes, inconsistentes; são eles os que mentem, que metem a mão no bolso dos que nunca estão presentes.
Lutamos por um bando de gente, pessoas ausentes que teimam em não mostrar os dentes, que fingem uma realidade social, que se inibem diante aos poderes papais ... feudais ... patronais ... patriarcais ... e mais, muito mais medos a corroer os desejos, os segredos de cada ser e o ser de cada desejo.
Nos vejo diante a portais de aço, que somente conseguiremos transpor quando de fato acordarmos deste sono profundo e nos colocarmos em guerra contra nosso próprio reflexo, e a partir de então nos tornaremos o inverso ou quem sabe um verso a trilhar pelos restos dos perversos.
Pasmo em te ver bem acomodado, ai sentado em sua casa; voce é um descaso, um marasmo que prejudica um todo, que domina um povo ... um polvo de infinitos tentáculos a envolver a mente destruindo as sementes, transformando seres em meros fregueses, em rêzes a caminho de cumprir com os seus deveres.
Acordem preguiçosos ausentes ... despertem desta paralisia latente e lutem pelo presente pois assim daremos força a um futuro que se apresenta inexistente.

Sampa (sem data)

Sobre as hipóteses.

Tento imaginar o que seria uma hipótese não vendo nada além de distorcidas imagens, metragens de um tempo imaginário que transforma o trabalho humano em algo mundano ... um segundo plano encobrindo os mecanismos da sociedade; deixando de lado as verdades para entrar no campo das diversas mentalidades, que ligadas a interesses e necessidades, tentam destruir o pensamento em prol dos vestimentos, dos óbitos e nascimentos, do cimento usado para se construir mais um monumento ... do excremento ... puro excremento lançado em nossas faces, turvando a visão e iludindo a razão ... vazão de um esgoto imundo, que retrata este mundo dominado pela ganância e pelo lucro, que agora tenta esgotar as forças produtivas decretando um novo tempo onde não mais existe a História, surgindo em seu lugar as mais diversas anedotas ... lorotas ... cambalhotas de um palhaço em um espetáculo circense, provocando risos nas pessoas que não possuem mais dentes, que não se acham como gente ... por certo não podemos lhes restituir os dentes, mas também é certo que podemos recolocar os trilhos na estrada, fazendo com que o trem da história volte a deslizar pelos caminhos que tantos se apressam em dizer esquecidos, banidos da era moderna, mas que podem restituir às pessoas a sua condição de seres humanos ... sem tronos, som donos ... cem anos seja o que necessitemos, pouco importando o tempo se não nos atermos aos fingimentos ... levantemo-nos.

Sampa 19.nov.1993
Somos apenas o reflexo do espelho, representamos somente a fome que assola nosso meio, a criança que implora quase de joelhos ... matança aflita ... mundo dos alheios.
É por decerto mais fácil ignorar as mazelas do social, sequelas devoradoras de pernas, panelas vazias abandonadas em uma janela.
Tendo em vista que nada é verdade, tampouco realidade; façamos de conta que nada é de nossa conta; que aquilo que vemos e sentimos não passa de uma estampa ... tampa a esconder-nos o defunto ... anca de uma dama a desviar-nos do assunto.
Imundo pensamento absurdo, mudo ser que nada escuta, que nada muda ... sacuda esta tolerância crua e renasça de tua tumba ò múmia estúpida.
Personagem de um quadro, etéreo resguardo ... retrato pálido dos esforços válidos, dos pescoços flácidos; negócios ... negócios são sempre negócios, coisas distintas impressas pela tinta, memória viva de uma imagem distorcida.
Enegrecida figura à esconder-se na penumbra, embrutecida ternura à esquecer-se das outras criaturas ... caricaturas de gente ... da gente feita miserável pelas mãos da avareza, da nobreza ... tristeza.

Sampa (sem data)
Um instante meio que parado,
um pássaro cantando ao largo em meio a ônibus e carros,
movimento apressado do mega burgo ...
cresceu a cidade engolindo tudo a sua volta,
envolvendo seres e dizeres ...
vozes que mais parecem murmúrios incompreensiveis,
sensíveis artérias por qual navegam as criaturas modernas ...
minhas pernas cansadas insistem em prosseguir na caminhada,
jornada repleta de desafios ...
mais parece um filme,
um filme misto,
de aventura,
terror,
romance
e comédia.

Sampa (sem data)
Tolice medida por índices, mesmice que existe ... insiste em dar sua presença aos dias como tudo se repetisse na tela da vida ... reprisesem preto e branco e a cores, nas colores dos colares de ouro, adornos dispostos em uma sincronia não harmônica ... sinfônica executando infinitas melodias que nada mais são do que imagens distorcidas, que nada mais fazem do que lembrar a mediocridade que constroí cidades ... combalidas verdades, descabidas paisagens enclausuradas como uma monja de beatas batas ... basta de termos ironia no lugar em que nos encontramos ... luar de sentidos humanos imersos em sombras espessas ... sempre as avessas ... obedeças as leis que estão impressas em tua testa, reis que te fazem de besta, um produtor de riquezas ... reais belezas representadas pelas favelas que enfeitam os morros, represadas pelos casebres que se inserem nos fossos, nas fossas que depositamos as fezes, nas rezas por qual encobrimos os rostos ... ser morto e jogado aos calabouços, calem-se os moços ... poucos são os rebeldes que não largam o osso, não tem por virtude o abandonar o povo ... são loucos e tolos estes seres sem pescoço; devoradores de esboços permeia as ruas nos levando às vias de uma loucura ... brancura impura a invadir a tua criatura, tua densa amargura que agora tange as páginas das intensas procuras ... buscas por um porto inexistente, tente outra vez te ver diante ao espelho, recupere a tua voz e brade ao mundo quantos homens morrem por estarem nulos ... insultos que nos fazem presente, repente de uma violenta gente, vertente que insiste em transformar o ser vivente, mente que me derrete o corpo remetendo-me ais nossos impróprios desejos.

Sampa (sem data)
Palavras ... palavras ... palavras,
na verdade afiadas facas à cortarem nossas faces em um enorme quantidade de pedaços ...
palavras,
que na mentira são as verdades que enfrentamos com serenidade,
com a senilidade da sociedade que reproduzimos,
engrenagens que damos brilho,
tonalidade e totalidade ...
quantos dades formam as cidades,
as maldades,
as beldades
e os arrabaldes ...
baldes cheios de míudos de gente
sendo despejados ...
desprezados ...
desperdiçados ...
enterrados ou quem sabe assados em um espeto ...
churrasco canibalesco saciando a fome dos que não te respeitam,
dos que se enfeitam com plumas e paetés
enquanto a fome devora muitos seres ...
enquanto revisam as leis em prol dos reis ...
ou dos réis ...
ou dos réus ...
véus que tudo encobrem na penumbra ...
fantasias que a todos alegram ...
avenidas ...
arquibancadas ...
piadas de um mau gosto ...
povo sem rosto disperso frente às alegorias e aos sambistas ...
passistas envaidecidos de suas evoluções diante a plateia enlouquecida ...
entorpecida pelo brilho ...
estampido de uma arma sem fogo emudecendo um povo ...
povo, palavra que enche a boca igual a um ovo cozido,
espremido no céu da boca ...
entre o céu e a boca forma-se um vazio,
que cheio de misticismos e cáries enfeita os estandartes de uma escola,
os altares de uma igreja
e os mastros de um bandeira.

Sampa (sem data)
Serei eu o que olha ou serei o muro, mais pareço um burro empacado no meio da estrada que nem para os lados olha ... oras bolas, deixemos de lado estas filosóficas lorotas e tratemos do que importa, mas o que realmente importa ... por qual porta devemos entrar e por qual devemos sair ... o melhor sem dúvida é rir, rir de nosso reflexo frente ao espelho, rirmos de nossos posicionamentos alheios ... destes versos imperfeitos, ou serão anversos, reversos, indigestos ... gestos estéticos de um espetáculo hermético, farsa-comédia que mesmo não querendo nela atuamos.
Não pense nestas palavras como algo depressivo, pois não são, sendo mais um modo de questionar a padronização e que somos reduzidos, pasteurização por qual passam nossos pensamentos e emoções ... canções entoadas por vozes desafinadas ... se não fosse este meu amontoado de palavras eu por certo explodiria ... ou será incerto ... decerto ... por certo?

Sampa 1995
Por vezes ao olharmos por uma janela podemos ver o mundo, porém em outras apenas um muro ... um muro no qual pode-se escrever um palavrão ou uma frase de amor, pouco importa pois geralmente neste muro esfacelamos as faces ... no dia a dia ... dia após dia cumprimos com a rotina que nos impõe a vida, rotina que de certa forma comprime e reprime fazendo-nos responsáveis por um crime que sequer existe ... um chiste que nos transportar a momentos extremos de alegria e melancolia em um mesmo instante ... loucura guardada em uma estante, o ser humano transformado em objeto decorativo ... frio ... inativo, passivo de toda espécie de arbítrio, ritos celebrados em um ambiente vazio ... vazio como as tênues palavras que escrevo ... queria tornar-me um sopro de vento, mas ai amanheço e não me reconheço pois o dia desperta com a sua sonolência, com a sua cadência ... decadência ... sapiência; sabia ciência que nos faz vislumbrar as verdades supremas ... demência ... virtude humana que nos faz olhar um muro vendo neste um mundo ... imundo, repleto de mofo e húmido.
Sampa 1995

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Tolamente me fiz ausente dos presentes. Fingi que não era comigo, que não pertencia à aquela tribo. Todos me olharam com um olhar assustado e murmuraram algo não decifrável. Era decerto um dialeto esquecido, desses no tempo perdido, mas pude ver em suas fisionomias a atonicidade exposta a luz do dia ... na fria e melancólica luz daquele dia.
Tentaram me dar dinheiro para que eu me fizesse um deles, não aceitei! Declararam-me rei pelo dinheiro que não aceitem. Disse-lhes que a beleza da liberdade era mais forte que a tristeza daquela cidade.
Então pedras reclamaram, lustres balançaram, janelas racharam. O maciço ouro tornou-se opaco, umvácuo criado em um instante passado desmoronou os alicerces desgastados.
Vultos corriam em impensada agonia, lajes caiam sobre ricas especiarias, as ironias desapareciam e as chamas consumiam, engoliam o que restava de bom, assim como todo mal daquela ilha.
Abriu-se a terra como uma cratera sem fim, fluindo desta elementos vitais ... vitrais moviam-se alternadamente, murais de imagens sensoriais clamavam por paz; mortais procuravam o cais.
Rolou uma enorme pedra sobre a face da terra, surgiu a sombra do abutre ilustre ... embuste.
Nada restou daquela podre vida. As avenidas em sangue jaziam, as moradias de ricas famílias já não existiam. A riqueza foi exposta à pobreza e o humano tornou-se parte da natureza.

Sampa 1990
A verdade se esvai, se esvazia no sangue e na fome das crianças sozinhas; aquelas que moram nas avenidas, que não tem mais nada a não ser uma arma, outras vezes cocaína.
Cola ... droga ... vida banida. Inserida nos gráficos de violência, nos trágicos destinos de uma penitência, sonolência.
A sociedade permanece em silêncio, permanece a produzir modos de conduta e falsos monumentos. Nada importa a não ser que chova na horta, que o verde dollar encha a mão dos homens para a sua glória.
Me vem na mente um palavrão indecente, mas que porra! Nunca se toca esta gente? O que será que eles sentem?
Planto uma semente e vejo nascer um dormente. Já nascemos doentes pois tudo que fazemos são regras decadentes, são pestes existentes.
Peito prá fora,barriga prá dentro; entre em forma a qualquer momento. Mandamentos ... 10, 20, 30; infinitos mandamentos, a todo momento nos impõem questionamentos; reclamamos mas mesmo assim comemos excremento.
Faço uma aposta! Um quilo de bosta como voce não consegue se olhar no espelho vendo seu próprio esqueleto. Como voce não consegue respirar direito sentindo seu próprio cheiro.

Sampa 07/dec/1990
Assumo um ar de bravo, grito a todo pulmão tudo o que não é necessário, me finjo de otário. Sento no alpendre vazio mirando um mar imaginário, um lago, um estuário.
Velejo em um barco sem velas que ruma ao abismo sincero, crio alegrias e tristezas nas pontas de uma esfera, nas guerras internas ... garras em minha matéria.
O alvoroço se espalha, o calabouço se espalha. Espelham a angústia, a tristeza ... a vida presa nas palavras avessas, acesas.
Rio de mim mesmo quando olho meus tornozelos, meus desajeitos ... defeitos. Volto a recontar-me uma história, uma pobre escola carregada em uma sacola. A hora ... a hora passa sem deixar vestígios, sem os medos do destino.
O dia ... o dia arregaça as suas mangas no labutar sem sentido, no lutar por um pouco de grana; ao acordar me deito na grama. Dramas de um sisudo amanhecer, esqueço das coisas elementares e vejo páginas devorarem imagens, paisagens, felicidades.
As igualdades são utopias falidas, feridas que nunca cicatrizam; que no templo da noite ironizam os esquemas sociais ... os dilemas que nos fazem tanto mal.
Isto tudo é real, é realmente real. Pode não ser natural, mas o homem a tanto tempo abandonou a si mesmo, que um simples adereço vale mais que as sombras esquecidas no cais ... nunca mais.

Sampa 07/dec/90
Vejam quantas grades existem ao nosso lado, estamos presos estando em plena liberdade; sentindo o peso de toda esta sociedade ... uma cidade, idade, puberdade.
Gritos sufocados velejam por este mar de desigualdades, pela lama da maldade ... trama de fidelidade.
Deixando os dades pra alguma fraternidade, invoco as pessoas sem senso comum à olharem a sua volta para verificar aonde esconderam a verdade.
Sim a verdade! Pois ao contrário do que dizem, a mentira não tem pernas curtas, isto sim, tem pernas longínquas e seculares, abraçando a nós por toda uma eternidade ... realidade.
Letras de um jornal, palavras de um ancestral. Incesto passado de pai para filho desde os primórdios da escrita. Um tempo passado, um rastro falso. Um rosto desesperado, um ser desfigurado.
São muitos os mandantes de nenhum crime, mais ainda são as vitimas deste mesmo delito. Somos nós os réus, os juízes e jurados; que condenamos uma imagem no espelho, executamos a nós mesmos.
Um livro sagrado, segredo não revelado. Um abismo bem abaixo por acaso, um caso sem solução, um vagão em rota de colisão, míssil disparado pelo simples aperto de botão, centenas morrendo então.
Centelhas de um fogo pagão, chamas de um coração. A terra, esta doce esfera adoece pelas mãos dos seus habitantes, destes seres ultrajantes que também detroem o mar, o ar, ou qualquer outro lugar.
Sinto que o frio esta por chegar.

Sampa 02/ene/91
A esquerda adoece, a direita enriquece e o centro permanece. A democracia é uma hipocrisia que engolimos no dia-a-dia; é uma ironia ... uma triste ironia.
Tenho pena do mais pobre por este não ter nem o que comer; tenho pena do rico pois este escala os degraus da vida, pisando em cabeças famintas ...
... vazias lápides em um terreno baldio, cão vadio que late sem ter um porque.
Um frio invade m'alma, um trio cantante cantando as alegrias do viver, catando moedas ao anoitecer. O meu ser se expande e tenta se esconder. O meu eu se espanta pois tudo ainda terá que aprender.
Empreender uma luta diária não nos traz nada a não ser a fadiga da batalha, a fatia mal dada, econômica e saqueada.
Sacada de um palácio vazio, arcada de dentes vazios ... rios e lagos, planícies e planaltos; é tão grande esta terra que me pergunto: Por que tantos lutam por ela? Por que os frutos não pertencem aos que realmente habitam nela?
Favelas, velas, caravelas sombrias carregando falsas donzelas; faltam panelas e também o que por dentro delas. Regras, mágicas regras feitas por senhores que pulam janelas, que espreitam em cada esquina, que desrespeitam, que se ajeitam, que inflam o peito e prometem aquilo que nunca será feito.
Meu leito, teus peitos. Nossos caminhos são estreitos, nossos inícios a muito foram esquecidos; os lobos estão mais famintos, o mundo prossegue no mesmo trilho.

Sampa 09.nov.90
Poder ... me entreguem o meu que eu também quero ser rei, quero ser a lei.
Em vez de extorquir, distribuir. Em vez de matar, perdoar. No lugar do altar colocarei um mar, por cima das avenidas plantarei grama e árvores frutíferas. Lhes direi aquelas palavras nunca ditas, abrirei as portas da alegria.
Quero para sempre extinguir a tirania, torna-la parte de um momento passado, um segmento não renovável. Da grana mais quero distância, pois ela só nos causa ganância.
Como sou tolo. Como posso escrever um sonho tão bobo? A vida é uma chuva infinita que sempre molha as trilhas, que sempre lava os dias.
O que quero, ou melhor, o que espero é que os homens se tornem sinceros. Realmente somente isso me basta, nada de poder, nada de ser rei; será que algum dia conseguirei ver este mundo mais de perto ... desperto olhando imagens enevoadas, lágrimas pálidas, páginas opacas. A realidade é triste, assim como ver alguém arrancando os próprios cabelos, se atirando no fundo do mundo.
Esta sociedade nos leva a maldade, a cada passar de horas aumentamos nossa mortalidade.

Sampa 02/ene/1991
Meus olhos estão cansados, já não mais enxergo do outro lado; já não mais espero ser eterno. Minha mente congelou-se, meus gritos ninguém mais ouve ... o que houve? O que aconteceu com a ternura? Foi ela vencida pela amargura ou estou só no meio da rua?
Lua, brancura, loucura. Vida estúpida a afogar minhas procuras, minhas tenras aventuras. Vejo-me diante paredes sem portas, ordas inimigas tramam a minha derrota, mas estas não estarão presentes quando de minha vitória; quando eu finalmente vencer a glória. Não tenho trajetória, tão pouco uma história, mas gabo-me por ter um pouco de memória.
A sua hora, a nossa intensa hora.
Mentir! Mentir! Mentir! Fugir da verdade não faz ninguém sorrir; somente faz o mundo triste sentir.
Largar os anos, esquecer os planos, mudar a direção da nave à deriva, repartir os ganhos com todos os humanos, se iludir com os sonhos e depois de tudo, extirpar o mal que habita os homos.
Somos tolos, somos povos; somos óvulos. Temos pouco a perder e menos ainda a ganhar, palmas diante um altar.

Sampa 30.oct.90
Passávamos os dias em intensa e absurda alegoria ... a alegria findava a busca e mesmo assim não descobriámos a rebeldia.
Ventos sopravam, nuvens se deterioravam. As lágrimas solitárias rolavam à toa por rostos anônimos, por esgotos podres.
Um céu de lua e estrelas dava lugar a bombas e incertezas; a vida tornou-se mais frágil, a ganância ficou mais ágil.
A quem interessa a paz, se a guerra tantos lucros traz? Afinal mais armas serão vendidas, a tecnologia armamentista provou ser a mais desenvolvida, a mais mortífera.
A quem interessa novas maneiras de prolongar e melhorar a vida, se tão excitantes armas já foram construídas? É certo que quando se fabrica um armamento, para o seu uso se fará o momento.
A belicosidade humana fornece a chama para manter as ideologias econômicas. As altas cifras de money, as altas baixas entre os homens.
Em um saco plástico retornará o heroí ao seu lar, por debaixo da terra este será esquecido como tantos outros de um passado vivido.
As guerras nunca se alteram, simplesmente ficam mais modernas, menos sinceras.

Sampa 22.jan.91
Rezem! Orem! Supliquem ao onipotente glória para esta hora presente. Queiram aquilo que se faz ausente e ganhem o mesmo de sempre.
Nada! Nada! Nada! Nada além de nada!
Maldada fatia de uma torta pálida, malvada tirania à transformar florestas vivas em madeiras mortas.
Foi lançada a pior da bombas, a onda que destroí o cérebro ... não nos levam a sério.
Um imenso deserto. Abutre esperto.
Tanques, canhões, mísseis teleguiados; para todos os lados sinto o cheiro de corpos putrefados, destroçados, ensaguentados. Tudo isso causado pelo poder incontrolável, intragável.
Um inimigo, um amigo; símbolos destruídos ... destítuidos de representar o homem. A força bruta nos dará este instante, nos levantará em corpos ardentes; chamas do inconsciente.
Na noite de um dia, alguém sorrirá por estar contente e então o mundo se libertará; deixará de ser ilusão e passará de fato a pertencer a cada vivente.

Sampa 1991
Crianças morrendo de fome e os governantes não sabem os seus nomes. Pessoas sofrendo diante os degraus do pensamento por terem medo de serem homens.
As ilusões nos assolam, pátrias mórbidas lutam por sua glória. Os maus ventos que varrem este país, de nada importam pois todos já fecharam as suas portas. Os jornais estampam fotos da guerra, os políticos como sempre estão atolados na merda e os mais ricos continuam a se agarrar a toscas moedas.
A roda da vida gira! Os tempos do norte mudam, as lembranças da morte ficam. Detritos, subnutridos; os seres humanos não mais tem um destino, mais a baixo rastejam sobre fétidos vestígios ... vestidos para um sacrifício, um sacro-ofício dos templos cristãos, os mesmos templos onde eram queimados os pagãos. Mestres mortos no arder de seus corações.
No arder de nossos corações, estaremos em torpe deflagração ... estaremos em órbita de uma qualquer contestação ... constelação de astros aflitos, estrelas que rumam a um infinito ... grito perdido, espelho partido. Já não mais enxergamos nossos rostos refletidos; e vemos, isto sim, olhos com ares inimigos, olhos de uma maldade sem sentido.

Sampa 22.jan.1991
Voce deve votar! Voce deve lutar!
Voce tem o dever de proteger aquilo que lhe impõem com as leis, mas são tantos os reis.
São muitos os senhores do mundo, são túmulos o que nos reserva a terra. O que importa viver de acordo com essa realidade escrita, se a cada dia nos castram a rebeldia?
Tudo é feito sob medida: acordarás a primeira luz do dia, dormirás somente quando deres o último suspiro de vida.
Vejam! Olhem a lua, ela permanece nua. Enquanto nós caminhamos por esta deserta rua, infinita loucura ... não existe cura pois somos parte da matéria impura.
Chorem! Orem ao seu deus mesquinho. Glorifiquem a maldade humana que se esconde por entre suas entranhas, por dentro de toscas cabanas ... que bacana!
Uma banana. Sedosa dama de uma tropical estância, distância plana; cama de um faquir, câmara de horrores vis.
Fizz. Gin fizz. Um álcool qualquer usado para esquecer, para esconder as contas a receber, as margens de um entardecer ... gritos ao anoitecer.

SAMPA 1991
Palavras de vários sentidos, povoam mundos e abismos; os gritos não ouvidos ecoam junto aos pés de ídolos corroídos; passos seguem a nenhum destino. Traçamos infindadas retas, tornamo-nos metas.
Cotidiano insano destruindo anos, modificando sonhos; meus sonhos, meus anos; se foram longe a onde passa o vento uivando, a onde de cristais são feitos os castiçais, mortais.
Vão lúcidos os olhos mirando miragens, paisagens ... vaidades. Que as verdades nunca sejam ditas, pois nossa podre medida apenas mantém as coisas já ditas; não mintas. Não finjas que não me escutas; que as pulgas não sugam o teu sangue, que na rua não nascem sementes. Serei para sempre um trapo em vez de gente; um asno a não crer em minhas vertentes, nas loucas bruxas de um sol ascendente, verso insistente.
Das regras não sei fugir, das flechas não me escondi; sorri ao carrasco assassino como quem não canta um hino, como quem tem um destino. O seu vizinho espia por sobre o muro, um murro no focinho, desagrado com ar de martírio, como um lar em desalinho.
Sinto a lua roubando minhas imagens, sugando minhas viagens, mudando a realidade, exterminando a maldade; transformando ou modificando, criando ou inventando um assunto, uma realidade.

SAMPA 21.nov.1989
Os prédios me olham com seu olhar sinistro, corro, fujo, não existo ... não desisto do meu intimo, procuro os bruxos no infinito.
Esquisito me sinto, extinto me acho nos plenos atos de existir, extorquir palavras pouco letradas, faces lavadas. Ouço um instinto a me dizer algo, alguma coisa sem sentido, algum mito destemido; fui rei e agora sou bandido, estou banido dos tempos terrestres, dos templos campestres.
Nesta estreita rua não passam dois indivíduos, serão dois e nenhum caminho, nenhum desvio. Meus cílios se colam no enxergar restrito, as veias abertas consomem a máteria, obstruem a árteria, mais inércia. Falo e reflito sobre os gritos aflitos, vultos tranquilhos, espíritos.
Sou um insano sem vida criando textos não explícitos, um gigante adormecido, envaidecido. Transformei o fogo em fogo, a água em água em água, não acrescentei nada, não modifiquei nada. Passam lentas as horas sobre as bordas de minha memoria, sobre as orlas da história; queixo-me ao vento pois ele não pode escutar-me, não pode ajudar-me. destravo as portas da ilusão e sou jogado nas garras lúcidas de várias paixões ... vejo uma procissão carregando falsos ídolos, protegendo fartos pudores, odores de cheiro maldito, fedores bíblicos.
Mais sabe a traça de livro, pois ela devora palavras enquanto nós tentamos guarda-las, tranca-las nos porões de nossa mente, espaço do inconsciente; para nós elas de nada valem por não serem usadas, são simplesmente arquivadas.

SAMPA 14.nov.1989
Não irei participar desta falsidade, pois de forma alguma concordo com a obrigatoriedade, sou um ser livre pela própria natureza humana, não serei cúmplice desta inverdade.
Eles pensam que podem fingir a todo momento, eu lamento tendo em vista o atual momento. Falam tanto em uma tal democracia, pura hipocrisia.
Discordo do termo grego; demo não significa povo e sim demonio ... um demonio que rouba nossos sonhos, transforma a todos em grandes tolos. A ideia que a pátria me traz, me faz vomitar, enxergar uma divida infinita, uma liberdade esquecida.
Discursam sobre um voto consciente, mas o inconsciente faz lágrimas pelos decadentes, indecentes por germinarem falsas sementes, criando o povo sobre o olhar de uma luz incandescente.
O cidadão tem o direito da escolha de seu representante, deve ter também o direito de querer ou não escolher.

SAMPA 14.nov.1989

Obs.: a ideia pode não ter saído lúcida, mas de certa forma expressei meus sentimentos.
Meu coração se agita nas perdidas trilhas de minha vida; minha querida por onde andará nossa rebeldia?
Talvez ela seja infinita e nós pouco saibamos aonde passamos os dias. Veja aquela sonolenta ilha, permanece inquieta no traçado das eras, gritando e berrando, tornando sua terra numa donzela infértil, estéril.
Vemos o azul marinho tornar-se daninho, um imenso desvio, olhos presos no vazio. Sinto a fria sorte dos que rumam ao norte ou a qualquer outra parte, não mais existe a arte.
Respire este ar imundo, sinta a fundo o pesar lento de décadas de pouco caso, de esgotos abertos ao nosso lado, vermes a voar pelo espaço.
Livro-me das vestes de escravo, encaro as maldades como forma de realidade, quero por fim nesta falta de verdades, de páginas e mais páginas de luxo e desigualdades, anulo a flor de tua virgindade, não faz mal que a lua seja nada, que a rua continue muda; pois jogarei os trapos em áreas ditas públicas, ditas públicas ... abraço minhas ilusões, pois com elas mudo até mesmo a razão, a vazão do ódio contido, escondido dentro de meus instintos.

SAMPA 13.nov.1989

obs.: tentei mas não encontrei as palavras certas para esclarecer meu padecer, meu triste viver. queria a alegria, mas ela tornou-se fria, não mais é minha.
Voe pássaro tão lindo, voe para onde ainda não te tenham ferido, não te tenham perseguido. Bate tuas asas e alcance um voo para o infinito, para longe dos seres destrutivos.
Não deixem que espalhem teu sangue tão querido, pelas paredes brancas deste tal hospício ... precipício aberto nas valas de teu sacrifício, teu disperdicio.
Perdeste anos a procurar pelos humanos, mas eles são apenas enganos; enganam a si mesmos diante de espelhos, frente a seus desesperos, tolos zelos ... tornozelos de ouro maciço não resistem ao maçarico e aos teus gritos; são suditos menores, maiores vozes e as vezes algozes.
Ouço túmulos a reclamar do passado, vejo tumultos a representar o passante, semblantes a indicar o porvir, o existir entre farsantes torna a carne um alvo incessante.
Quem me dera ter asas, para alçar este voo súbito, mas este estúpido não conhece a direção de suas vertentes, de suas nascentes ... decadente persiste no solo a esperar que as feras lhe cravem os dentes, lhe matem para sempre.
SAMPA 07.nov.1989
Talvez exista a paz, em algum lugar ... talvez exista a paz.
Atravessam os anos; todos falando.
Olhamos os campos; devastados campos.
Atravessamos os campos; devastados falando.
A tempestade enegrece a cidade, cai a chuva pesada inundando pobres moradias ... minha namorada ficou nua em uma qualquer estrada.
Para onde iremos, a quem procuraremos?
O sol se esconde diante a tantas insanidades, foge ele da verdade, da maldade ... essa nossa carruagem. Velozes estamos rumando para a eternidade.
Nos faz falta a coragem, de exigir a liberdade, de querer sem temer que estas regras se tornem leis:
Que o jurídico seja justo, que o legislativo seja o legislador e que o executivo seja o executor. A tudo isso soma-se a pureza, única forma de alcançarmos a grandeza.
Abaixo as teses economicas, pois estas só causam a fome cronica. Lucros, lucros e mais lucros, somente isso importa aos homens mudos, aqueles que nunca aparecem por estarem ocupados a conjugar dois verbos: eu enriqueço e tu empobreces.

SAMPA 18.feb.1991
Passos, lábios, espaços ... esparsos olhos buscando a lealdade; a sinceridade abstrata, a verdade e mais nada. Malvada fúria a corroer nossos sentimentos, falsa figura levando-nos ao fingimento ... firmamento. Não busco sangue, tão pouco o teu sofrimento; quero a vida, por isso deixo a ti um beijo de despedida, um adeus até a próxima esquina.
Por esta larga avenida passeei até o fim do dia, hora vadia. Vislumbrei o ser homem em seus possantes veículos, usando ternos ou vestidos; uns tantos maus, outros apenas introvertidos ... investidos em buscar grana apesar dos muitos sacrifícios.
Ofício sem poucos vícios ... litros e mais litros desta aguardente amarga; lágrima solitária.
Um mar sem vida, floresta destruída; nas margens do progresso faminto restaram apenas troços ... destroços do que um dia foi belo, do que um dia foi o elo entre o homem e o eterno.
Eternamente a mente desfalece, se esquece de sua busca interior, luta em uma escura gruta. Uma lua despencando sobre o cérebro humano, o mundano prossegue rastejando; urinando nos seus enganos, defecando diante os bárbaros ... seus semelhantes.
A latrina cheia, a vitrine plena nos últimos gritos da moda. Na hora de um dia qualquer explodirão as duas, tornando a moda uma merda e a merda numa moda; qualquer dia a qualquer hora.

SAMPA 27.Abr.1990
A loucura transforma o sangue em lágrimas de nenhuma ternura, insana torna-se a procura. O mal é real, assim como o bem poucos detém, não importa que a rua continue suja, pois sua armadura é de pura bravura ... gravura estampada no âmago de um ser, uma espécie de querer.
Querer a chuva, limpar nas águas puras a profunda luta do existir; insistir a fundo nas fugas por liberdade, grito contra a sociedade ... anonima página de uma inverdade, uma cláusula no tempo infinito, uma pausa para entender nossos instintos.
Ser banido ao mundo introspectivo, inundar as praias e as raias da corrida, da vida inserida, ferida aberta aos germes e vírus, aos olhos inimigos.
Perfura o corpo a arma destrutiva, estanca o sangue o curativo asséptico, qual o valor de ser ético, de esperar os povos de andar esquelético, estético. A fome come a esperança, assim como os homens matam crianças; no apertado laço da forca assassina viu-se imagens de uma tola rebeldia, um dia as árvores serão de pedra e as naves destroçadas levarão levas e mais levas dos que restarem nesta terra, na breve era desta esfera.
A breve espera nos leva a pensar, imaginar, transportar os sonhos para além dos nossos enganos, para onde não hajam planos, onde os anos esmagam os tiranos.

Sampa 07.nov.89